sexta-feira, 20 de agosto de 2010

Duas obras essenciais

Há filmes que podemos considerar essenciais. Quem nunca assistiu a qualquer obra-prima de Alfred Hitchcock (e há quase uma dezena delas, mas Os Pássaros e Um Corpo Que Cai se destacam), a uma comédia de Mel Brooks, a um drama de Frank Capra, a um faroeste de John Ford ou a um musical de Stanley Donnen, com certeza nunca viu o cinema norte-americano em toda a sua essência. Há muitos outros exemplos. Pode-se dizer tudo do cinema feito nos Estados Unidos, menos que ele seja ruim. Há os que preferem os chamados filmes de arte do Leste Europeu, da França ou da Espanha. Outros endeusam os filmes pós-guerra da Itália. Mas nada se compara com o profissionalismo e competência do cinema norte-americano. De vez em quando, um filme dos EUA surpreende e consegue deixar a platéia muda, dada a crueza da sua temática e da abordagem. Só quem nunca viu Vinhas da Ira (The Grapes of Wrath, 1940), do grande meste John Ford é capaz de desconsiderar duas obras-primas do cinema americano saparadas por quase 25 anos. A primeira delas, de 1985, foi uma tentativa de Steven Spielberg para mostrar que não era especialista em filmes infanto-juvenis. Em 1985 estreou A Cor Púrpura (The Color Purple), baseado em livro do mesmo nome de Alice Walker, cujo sucesso catapultou a carreira de Whoppi Goldberg (foto à esquerda, até então, uma comediante da TV) — ela concorreu ao Oscar na sua estréia (mas que só levou anos mais tarde, como coadjuvante em Ghost). A história da ignorante Celie, estuprada e engravidada pelo próprio pai, considerada uma débil mental e ‘doada’ a ‘Mister’ (Danny Glover), de quem passa a ser escrava e objeto sexual. O seu inconformismo acaba com o aparecimento da cantora Shug Avery (Margareth Avery), por quem ‘Mister’ é apaixonado, levando Celie a revelar seu espírito brilhante, ganhando consciência do seu valor e das possibilidades que o mundo lhe oferece. Filmado com delicadeza, A Cor Púrpura não deixa de ser um libelo contra a opressão. Só a música Miss Celie Blues, de Quincy Jones e interpretada por Tata Vega (que dubla Margareth Avery) já vale como garantia de qualidade. No mesmo caminho, aparece outro filme, do ano passado, que também teve uma comediante num papel dramático (pelo menos ela levou o Oscar) e foi baseado num livro. Preciosa - Uma História de Esperança (Precious: Based on the Novel Push by Sapphire, 2009) é um verdadeiro soco no estômago: Claireece Jones Precious (Gabourey ‘Gabbie’ Sidibe, na foto à direita) sofre privações inimagináveis em sua juventude. Abusada pela mãe (a comediante Mo‘Nique, no papel que lhe deu o Oscar) violentada por seu pai, ela cresce pobre, irritada, analfabeta, gorda, sem amor e geralmente passa despercebida. Porém, acaba tomando consciência de sua importância e da importância da amizade. Os problemas cotidianos tornam-se corriqueiros diante da vida de Precious (a Preciosa do título). Mas o filme também consegue, diante da direção inspirada de Lee Daniels, mostrar a verdadeira redenção de uma personagem tão sofrida e difícil. Lenny Kravitz e Mariah Carey também estão no filme e cumprem com correção seus papéis. A Cor Púrpura e Preciosa precisam ser vistos e revistos. Uma coisa eu garanto: no final, ninguém ficará indiferente.

Nenhum comentário:

Postar um comentário